Este texto originalmente foi publicado na revista Aptare e pode ser lido também AQUI (pags 34-36)
Imagine-se com 30 e poucos anos indo visitar uma amiga que acaba de ter um bebê na maternidade. Ao segurar esse recém-nascido no colo, você pensaria que ele poderia ser seu sócio no futuro? A resposta mais provável é não. No entanto, essa é a realidade que a equipe da 50mais Ativo vivencia há alguns anos.
A expectativa de vida no Brasil e no mundo aumenta gradativamente. Ao mesmo tempo, as taxas de nascimento vêm caindo em alta velocidade. Portanto, a presença de pessoas 60+ na sociedade será cada vez maior. E com os negócios não será diferente, afinal, além da fonte de renda, o trabalho significa a realização e a manutenção de uma rede de relações, de manter um propósito, o que pode interferir na qualidade de vida no envelhecimento. De acordo com a pesquisa Tsunami 60+1 , 63% das pessoas com mais de 60 anos são provedoras da família.
Em meados de 2017, quando as sócias começaram a estruturar a empresa, amigos e familiares questionaram o negócio, que envolvia uma sócia com mais de 70 anos, aposentada e já tendo sido responsável por três empreendimentos. Porém, a resposta dada pelas três era de que a convivência intergeracional, embora um grande desafio, trazia visões e valores de mundo distintos, o que enriqueceria o trabalho e proporcionaria aprendizado e desenvolvimento. Assim, no início de 2018, a 50mais Ativo foi formalizada.
Mas como definir as gerações? Como saber se existe intergeracionalidade? Segundo a Teoria da Coorte Geracional, as gerações são uma construção social, na qual um grupo de indivíduos, nascidos no mesmo contexto histórico e sociocultural, é influenciado por um conjunto de oportunidades e experiências únicas, o que faz com que sujeitos nascidos durante um período determinado partilhem valores, atitudes e crenças.2 Hoje, quatro gerações coexistem no mercado de trabalho (baby boomers, X, Y, Z) e cada uma delas tem uma forma de ver e de encará-lo. Em breve, serão cinco gerações juntas. Uma convivência ainda carregada de estereótipos e preconceitos, do velho em relação ao novo, do novo em relação ao velho, muitos paradigmas deverão ser quebrados para que as empresas consigam continuar gerando resultados. A intergeracionalidade trata da interação entre essas diferentes gerações, de forma harmoniosa, respeitosa e colaborativa, ou, como diz Ferrigno3 , “não apenas tolerando o outro, diferente de mim em algum aspecto, mas desejando a sua companhia que me completa e enriquece” (p. 14).
Imaginem três mulheres com diferentes idades e formações e com algumas características próprias do tempo de cada uma. Como seria um relacionamento harmônico e o que significariam essas diferentes idades na empresa?
A 50mais Ativo conta com uma representante da geração baby boomer, nascida em 1948, no período pós-guerra, com o mundo buscando o rápido desenvolvimento. Eram tempos em que se investia nos estudos e na valorização do trabalho – as pessoas permaneciam na mesma empresa até a aposentadoria para que um patrimônio fosse construído Mas trata-se também de uma geração mais resistente a mudanças, que prioriza a estabilidade, especialmente na carreira, aspecto reforçado pelos anos vividos durante a ditadura militar. A tecnologia não é algo tão próximo dessa geração.
As duas outras representantes da empresa fazem parte da geração X e, apesar de trazerem algumas características da geração baby boomer, como estabilidade na carreira e disciplina, viveram com maior liberdade e buscaram o que efetivamente queriam para si mesmas. É uma geração com menor otimismo, decorrente da política adotada durante a ditadura militar, o que trouxe um certo ceticismo em relação a autoridades e governos. As pessoas dessa geração valorizam certificações formais, treinamento profissional e estabilidade. Foram as primeiras a experimentar os avanços tecnológicos, o computador e o celular, portanto têm maior facilidade em lidar com a tecnologia.
Considerando o que cada geração viveu e suas peculiaridades, podemos entender que é isso que molda a maneira que os indivíduos têm para lidar com problemas e encarar situações favoráveis e adversas. Ou seja, a diferença intergeracional na 50mais Ativo torna a possibilidade de encontrar soluções às demandas dos clientes muito mais rica, resultando em um trabalho singular e de maior produtividade. A intergeracionalidade é vivenciada de forma positiva na empresa, o que não ocorre em todos os ambientes corporativos. Por isso, é necessário educar a população para essa convivência e saber administrá-la no ambiente profissional, já que a previsão é sermos uma população, na sua maioria, de pessoas idosas.
As trocas intergeracionais possibilitam a quebra de barreiras, minimizam julgamentos, promovem um ambiente mais inclusivo, disseminam valores de colaboração e solidariedade, geram inovações, facilitam a resolução de problemas e novos modelos de comunicação – em resumo, favorecem as principais características para um trabalho em equipe eficaz. O mundo pós-pandemia nos confere novos desafios, como o trabalho de forma híbrida. O capital humano tem um papel significativo no desenvolvimento e na implementação de estratégias, trazendo vantagem competitiva na agregação de distintas capacidades que prosperam o diferencial da empresa.
Conhecendo as características históricas de nossas gerações, é perfeitamente possível o questionamento: “Como tantas diferenças podem dar certo em um empreendimento?”. São justamente as pequenas diferenças que nos fortalecem: momentos vividos em épocas distintas, o olhar para o novo, o comprometimento com objetivos, o respeito mútuo. Esse encontro de gerações é extremamente produtivo e enriquecedor. Acreditamos que esse deve ser o verdadeiro sentido da intergeracionalidade. Entre os benefícios dessa convivência incluem-se:
• Experiências somadas: quando é respeitado o conhecimento adquirido através das vivências individuais;
• Aprendizado: quando os saberes são compartilhados, as decisões são discutidas e as ações de cada uma são complementadas;
• Respeito e criatividade: quando se disponibiliza tudo o que foi aprendido ao longo dos anos. A soma de tudo isso é o que sentimos ser a base de nosso viver empresarial;
• Acolhimento e inclusão: o convívio integrado é o que consideramos mais importante, pois a diferença de idade nem é percebida por nós mesmas.
Apesar disso, ainda existem diversas barreiras a serem quebradas. A 50mais Ativo já sofreu preconceito por ser uma empresa formada apenas por mulheres e pela idade das sócias – evidência de que o patriarcado e o idadismo existem na sociedade e continuam presentes na saúde.
Porém, a força do nosso relacionamento nos revigora, porque acreditamos no que, como e por que fazemos. Em fases diferentes da vida, incentivamos o recomeço após cada barreira, pois sabemos da importância que o trabalho tem para cada sócia e estamos sempre tentando conciliar os interesses e anseios de cada uma. Acreditamos que uma forma de lutar contra esse idadismo é quando todas nós fazemos questão de estar presentes em toda atividade para a qual nossa empresa foi convidada ou contratada. É quando podemos mostrar a empatia que existe entre nós, quando desmistificamos os conceitos que ainda existem sobre diferentes idades, quando quebramos alguns preconceitos, quando provamos que é possível, sim, e o quanto é gratificante o trabalho que une pessoas de diferentes idades.
Referências bibliográficas
1 TSUNAMI60+. Conheça os maduros. A geração do futuro. 2022. Disponível em: https://tsunami60mais.com.br/#consumo . Acesso em 12: abr. 2023.
2 SANTOS, G. T. dos . et al. A intergeracionalidade no mercado de trabalho: desafios e potencialidades. Revista Ibero-Americana de Humanidades, Ciências e Educação, São Paulo, v. 8, n. 12, p. 505-528, 2022. DOI: 10.51891/rease.v8i12.7998. Disponível em: https://periodicorease. pro.br/rease/article/view/7998. Acesso em: 22 abr. 2023. 3 FERRIGNO, J. C. Conflito e cooperação entre gerações. São Paulo: Edições SESC SP, 2013.
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